“Orlando: uma biografia”, Virginia Woolf

Por Vitor da Hora

Orlando: uma biografia é um romance da escritora britânica Virginia Woolf, publicado primeiramente em 1928; a primeira edição brasileira da obra foi lançada vinte anos depois, com tradução da escritora modernista mineira Cecília Meireles. Virginia nasceu em 1882 no pequeno condado de Middlesex na Inglaterra, filha de um editor e crítico, tendo uma adolescência traumatizada pela perda precoce da mãe e de uma meia-irmã. Ao lado de sua irmã, a pintora Vanessa Bell, reunia-se com o grupo de intelectuais que viria a ser conhecido como o Grupo de Bloomsbury – composto por nomes como John M. Keynes, Duncan Grant e Roger Fry, entre outros – onde conheceu seu futuro marido, Leonard Woolf, com quem se casou em 1912. Com uma obra literária classificada como modernista e também tendo escrito ensaios feministas, os principais romances da autora são Mrs. Dalloway (1925), Ao farol (1927) e Orlando (1928). Tendo sofrido de depressão e transtornos mentais ao longo de toda sua vida, pouco após de perder sua casa em bombardeios inseridos no contexto da II Guerra Mundial, Virginia comete suicídio por afogamento em 1941. 

O livro formado por seis longos capítulos é narrado em terceira pessoa por um biógrafo fictício – numa ferramenta narrativa que busca satirizar as convenções tradicionais de produções biográficas – que escreve a trajetória do personagem que entitula a obra. Orlando é um nobre inglês do final do século XVI, descendente de uma tradicional família aristocrata – é descrito como um adolescente de dezesseis anos, dono de uma beleza e inteligência ímpares, encantando até mesmo a Rainha Elizabeth I. Após ter seu coração partido por Sasha, uma princesa russa, com quem teve um curto porém marcante relacionamento, Orlando parte para o Império Bizantino, onde serve como embaixador. Após fixar-se por mais de quinze anos em Constantinopla, certo dia Orlando – que até então era um homem – adormece por uma semana e acorda transformado em mulher. A troca de gênero da personagem é tratada como corriqueira pela própria e encarada naturalmente pelos outros que a cercam. Dotado de longevidade sobrenatural, Orlando atravessa séculos, passando da era elisabetana até pouco depois do fim da era vitoriana (segunda metade do século XIX), já na década de 1920. 

O enredo da obra foi inspirado na vida de Vita Sackville-West, poetisa com a qual Woolf teve um relacionamento extraconjugal, que é agradecida pela autora no prefácio do livro – que é considerado uma grande declaração de amor à Vita. Orlando foi adaptado para o cinema em 1992 em um filme homônimo dirigido pela britânica Sally Porter, com a atriz Tilda Swinton no papel do personagem principal – famosa pela sua aparência e estilo andrógenos – e diversas para o teatro. A trama é surpreendentemente inovadora por inserir temáticas tão vanguardistas, ainda mais em uma produção do pleno início de século XX, dentro de um romance histórico, formando antíteses. As reflexões de Woolf sobre a construção social dos papéis de gênero é de uma atualidade assustadora, assim como a ótica que a autora dá aos momentos de transição de gênero de seu personagem – como quando diz que a transformação de Orlando em mulher não lhe alterou sua identidade (p. 142) e que após disso a homossexualidade seria natural para ela, visto que passou séculos se relacionando com mulheres (p. 159) – brincando de maneira afiada com as convenções binárias restritivas inerentemente impostas à estas questões.

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