O Diamante Azul (Sherlock Holmes – Casos Extraordinários), de Arthur Conan Doyle

Por Camila de Lima da Silva

Releituras na Quarentena

Enfeitar a casa com pisca-pisca. Montar a árvore. Reunir a família. Cozinhar comidas típicas. Embrulhar pacotes de lembranças. Tal lista de afazeres é, para uns, motivo de júbilo, já para outros, infelizmente, causa de desânimo ou, até mesmo, indiferença.

Desde que a festa do Natal se tornou tão comercializada (a ponto de perder sua essência de celebrar o nascimento de Jesus Cristo), sabe-se que é uma das épocas mais desejadas pelas crianças a fim de ganhar brinquedos. Enquanto os pequenos anseiam por presentes materiais, um personagem nada convencional de Arthur Conan Doyle, porém muito querido, quer somente um presente: encontrar a resolução para um novo caso.

Destoante da correria e dos barulhos provindos dos tumultos das casas cheias de familiares reunidos em torno da mesa, Watson encontra, no apartamento da rua Baker 221B, um silêncio ensurdecedor. Nesse cenário, ele apresenta a todos mais um mistério a ser desvendado por Sherlock Holmes, seu melhor amigo, em O Diamante Azul.

Em pleno período natalino, o detetive mais famoso da literatura se encontrava encerrado em casa pensativo, estudando, esmiuçadamente, um objeto sem importância aparente: um chapéu velho perdido na noite do dia 25 de dezembro por um homem que sequer conhece.

Embora não fosse um momento propício para trabalhos, como se é de imaginar, Sherlock não precisou instigar nem mais um pouco seu amigo – e, inclusive, o leitor – para que ele começasse a se interessar também pela explicação dos fatos. Nessa conjuntura, Watson, que tem a função crucial de alguma forma de representar aqueles que leem,  já se envolveu com a trama e o diz: “Parece um objeto sem interesse, mas aposto que você me provará que é a pista fabulosa para desvendar um crime extraordinário”, tirando, dessa forma, da mente do leitor seus questionamentos e entregando-os diretamente a Holmes para esclarecê-los. Assim, pode-se dizer que Watson age como um mediador entre o leitor e o detetive com o intuito de fomentar e facilitar a leitura da obra.

É de comum acordo relevar algumas perdas e considerá-las normais, como perder as chaves, dinheiro, celular. Contudo, Sherlock – um homem bem atípico – não soluciona casos normais, mas somente os extraordinários e, com isso, todo seu esforço dedutivo se inicia em O Diamante Azul da mesma maneira inesperada, uma vez que ocorre graças a perda não só do chapéu surrado pelo tempo, bem como a perda excêntrica de um ganso.

Como se tal fato já não fosse cômico e surpreendente o suficiente para os leitores acostumados com os tempos atuais, no qual estão vivendo a monotonia do distanciamento social, a ele se acresce ainda mais um fato, o de ter achado um belo e raríssimo diamante dentro do tal ganso.

Sabe-se que, segundo o imaginário popular, o “bom velhinho” – aquele que faz sucesso com os pequenos e tem roubado o foco religioso na época natalina, atraindo a atenção para o consumismo –pode oferecer roupas caras, os melhores celulares, jogos e brinquedos diversos. Todavia, nem mesmo o Papai Noel poderia dar um presente tão bom para Sherlock Holmes quanto o policial Petersen deu ao confiar a ele o caso inusitado do ganso que, supostamente, alimentava-se de joias preciosas.

Contrariando as expectativas de Watson e do leitor, a explicação para o acontecimento não estava no dono do chapéu e do ganso. Tal caso envolvia muito mais pessoas do que se pensava, inclusive a Condessa de Morcar, que era a proprietária do diamante furtado no cofre do Hotel Cosmopolitan.

Além dessa ilustríssima membro da realeza, são apresentados aos leitores também os últimos a estarem próximo do cofre: o encanador John, a dama de companhia Catarina e o camareiro James. Somente John foi preso devido a ser o maior suspeito, porém isso não era o suficiente para um detetive nato como Sherlock. Sendo assim, ele estava determinado a encontrar as respostas desse evento, ainda que, por conseguinte, perdesse as comemorações de Natal.

Quando se trata de Sherlock Holmes, tudo é muito surpreendente. Tal fato é evidenciado, por exemplo, em O Diamante Azul, uma vez que, embora demonstre desleixo em participar das festividades natalinas e, rapidamente, trocar a ceia de Natal por um exaustivo serviço, ele mantém a essência desse período. Ao defender a fraternidade e o perdão neste caso, apesar de ser um homem muito egoísta e racional, Holmes demonstra que a época de Natal vai muito além do exterior, dos belos presentes e enfeites e que, na realidade, é capaz de melhorar as pessoas interiormente, tal qual aconteceu com ele.

Portanto, seja em período natalino seja nos dias comuns, uma boa leitura sempre é uma atitude que agrega no âmbito cultural, social, acadêmico e pessoal. Por isso, o bom costume da leitura precisa ser mais incentivado a fim de ser também mais desejado, assim como o Natal também deve ser mais aproveitado e, através dele, as pessoas se tornem mais conscientes de quem devem ser e, finalmente, busquem os hábitos saudáveis, por exemplo, da fraternidade e perdão tão bem divulgado por Sherlock Holmes neste inesquecível caso de um ganso, um chapéu e um diamante.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *