Por Vitor da Hora
Gabriela, cravo & canela é um romance do escritor baiano Jorge Amado, publicado primeiramente em 1958. Jorge Amado nasceu no município baiano de Itabuna em 1912, tendo se mudado com os pais para Ilhéus, também na Bahia, aos dois anos de idade, onde cresceu. Atuou escrevendo para jornais baianos, ainda adolescente, até se mudar para o Rio de Janeiro nos anos 1930 – onde entrou em contato com diversos intelectuais modernistas e publicou seu primeiro romance, O país do carnaval (1931). Foi perseguido político por sua militância durante o Estado Novo (1937-45) e, após a democratização, foi eleito deputado federal pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB) – com muitas das suas obras refletindo os valores de suas crenças ideológicas, como Capitães de areia (1937), Os subterrâneos da liberdade (1954) e, principalmente, O cavaleiro da esperança (1942) sobre Luiz Carlos Prestes – ao qual foi filiado até 1956. Eleito para Academia Brasileira de Letras em 1961, Jorge Amado foi agraciado com os principais prêmios da literatura portuguesa, como o Camões e o Jabuti, além de ter sido recordista de vendas – o que levou suas obras a serem transformadas em diversas adaptações de sucesso. A partir dos anos 1980, passou a viver entre Paris e Salvador, tendo falecido na capital baiana após uma parada cardíaca em 2001, aos 89 anos de idade. Gabriela é um de seus romances mais célebres, tendo sido adaptado duas vezes (em 1975 e 2012) em formato de telenovela pela Rede Globo – ambas as vezes contando com a clássica Modinha Para Gabriela de Dorival Caymmi na voz de Gal Costa como tema de abertura – e uma como longa-metragem para o cinema (1983).
Ambientada na década de 1920 na mesma Ilhéus onde o autor foi criado, uma zona de produção de cacau, a trama narra a história da personagem-título – uma jovem e pobre migrante, de bela aparência e personalidade ingênua e sensual – que, ao chegar desamparada na cidade, consegue um emprego como cozinheira no badalado bar do sírio (naturalizado brasileiro) Nacif Saad, com quem a personagem posteriormente passa a viver um tórrido relacionamento amoroso, cheio de vai-e-vens. O romance entre os dois serve como pano de fundo para uma série de disputas políticas locais entre coronéis “conservadores” e “liberais”, todos frequentadores do bar de Saad e do prostíbulo Bataclã, dirigido pela influente cafetina Maria Machadão.
O livro, elogiado pelo filósofo existencialista francês Jean-Paul Sartre como um exemplo de romance popular, foi o primeiro publicado por Jorge Amado após seu rompimento com o PCB – o autor, a partir de então, passa a destacar elementos do humor, erotismo e sincretismo religioso nacional, em detrimento de temas político-sociais. A tônica cronista, por vezes satírica, de Gabriela se tornaria presente em posteriores romances emblemáticos do baiano, como Dona Flor e seus dois maridos (1966) e Tieta do Agreste (1977). Contudo, há a presença na trama de questões trazem reflexões sobre as mazelas sociais do Nordeste, bem como o forte patriarcalismo presente na região, de caráter político – inclusive, apesar do autor já estar rompido com a ideologia comunista, o romance foi publicado e muito bem recebido na União Soviética. Gabriela é um ótimo exemplo da fase áurea da escrita de Jorge Amado, assim como uma boa síntese de sua obra como um todo, por isso ocupa um espaço intransponível no imaginário cultural brasileiro, sendo lembrado como uma obra de referência na literatura nacional e por suas bem-sucedidas adaptações – sendo um raro exemplo de sucesso tanto de público quanto de crítica, uma obra verdadeiramente popular.