“Só Garotos”, Patti Smith

Por Vitor da Hora

Patti Smith, nome artístico de Patricia Lee Smith, é uma cantora e escritora estadunidense. No mundo da música, Patti é lembrada por seu aclamado LP de estréia, Horses (1975) – que figura em diversas listas elaboradas pela crítica especializada de melhores álbuns da história, e foi eleito para preservação no Registro Nacional de Gravações da Biblioteca do Congresso estadunidense e para integrar o Hall da Fama do Grammy – e pelo hit Because the Night (1978), escrito em parceria com Bruce Springsteen. Só Garotos (Just Kids, no original) é um livro de memórias da cantora, mais especificamente sobre seu relacionamento com o fotógrafo Robert Mapplethorpe, para quem a obra é dedicada – publicado primeiramente em 2010, o livro foi vencedor do National Book Awards do mesmo ano. Mapplethorpe foi um conceituado fotógrafo, conhecido por seus provocativos trabalhos de teor homoerótico, suas fotografias já foram expostas nos principais museus de arte moderna mundo afora.

Só Garotos foi concebido como promessa feita por Smith a Mapplethorpe, pouco antes dele morrer em 1989 decorrente de complicações do vírus HIV, de que contaria a história da amizade dos dois em um livro. O livro é dividido em cinco capítulos – Filhos da segunda-feira, Só garotos, Hotel Chelsea, Juntos em caminhos separados e De mãos dadas com Deus. A narrativa do livro se inicia com a descrição dos primeiros anos de vida de Patti em um subúrbio de Nova Jersey, onde teve uma formação religiosa restritiva, até decidir abandonar toda sua antiga vida e partir rumo à Nova York. A chegada de Patti na megalópole coincidiu com o chamado “Verão do Amor” de 1967 – época de efervescência da contracultura e do movimento hippie muito bem capturada no livro, que chegaria ao ápice dois anos depois em Woodstock – sozinha e desempregada, neste contexto ela conhece Mapplethorpe, com quem desenvolve um forte vínculo e começa a se relacionar. Os dois começam a desenvolver seus primeiros trabalhos artísticos nesse contexto de desamparo, e passam a frequentar ambientes da contracultura nova-iorquina e círculos de artistas americanos conceituados (como Janis Joplin e Jimi Hendrix) – estas histórias estão contadas nos capítulos Só garotos e Hotel Chelsea, os que mais carregam a essência do livro. A amizade dos dois se transforma em um romance, que não segue em frente após Robert descobrir sua homossexualidade, mas o carinho mútuo entre eles segue inabalado. À medida que a carreira artística de ambos começa a deslanchar, os dois seguem por caminhos diferentes, perdendo o convívio mas não a amizade, que continuou forte até a morte de Mapplethorpe – estes são os temas dos últimos dois capítulos do livro.

Só Garotos possui um texto enxuto, que inerentemente traz um ritmo leve para a leitura do livro. Os grandes trunfos do livro são o retrato bastante rico que Patti descreve do cenário cultural nova-iorquino e estadunidense do final da década de 1960 e, claro, a ternura com a qual ela se refere ao seu relacionamento com Mapplethorpe, fazendo com que o leitor facilmente se afeiçoa à dupla. Patti Smith tem uma sensibilidade para escrita literária tão grande quanto para a música, de um talento ímpar.

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