“Jantar Secreto”, Raphael Montes

Por Lucas Giancristoforo

🚨 ALERTA: ESTE LIVRO POSSUI GATILHOS E CONTEÚDOS SENSÍVEIS COMO SEQUESTRO, GORDOFOBIA, USO DE DROGAS, TORTURA, ASSASSINATO E VIOLÊNCIA 🚨

“Jantar Secreto”, de Raphael Montes, é um livro de suspense nacional que contará a história de Dante, Leitão, Hugo e Miguel, quatro amigos que deixam a cidade natal de Pingo D’água, no interior do Paraná, e vão para o Rio de Janeiro, com o intuito de cursar suas respectivas faculdades, na esperança de construírem uma vida boa e tranquila – assim alcançando o sucesso que tanto almejam. 

Dante, que também é o narrador único do livro, estudou administração e trabalha como livreiro em uma livraria no Leblon, vendo-se constantemente frustrado pela não realização profissional que desejava inicialmente; Hugo trabalha como chef de cozinha, mas, devido a sua personalidade forte e bastante egocêntrica, acabou não tendo sucesso na profissão; Leitão é o mais nerd do grupo e sabe tudo sobre tecnologia, no entanto, sofre devido a sua condição de obeso e seu passado triste com a sua mãe (que faleceu quando ele era mais jovem, provocando inúmeros traumas psicológicos nele – fato que o faz acreditar que ela ainda continua viva – algo meio no estilo Norman Bates, personagem do clássico filme “Psicose”, de Alfred Hitchcock, que também passou pela mesma situação); por fim, temos Miguel, que trabalha num hospital público como médico e é o mais sensato e responsável do grupo de amigos. 

Assim que chegaram ao Rio de Janeiro, o grupo de amigos alugou um bom apartamento em Copacabana e até conseguiu alguns anos de estabilidade enquanto cursavam seus cursos na faculdade e começavam a trabalhar. No entanto, como nem tudo são flores, logo as dificuldades também foram aparecendo: o dinheiro foi ficando cada vez mais curto e a vida cada vez mais cara. O estopim para a série de acontecimentos principais do livro é justamente essa situação instável e o atraso de seis meses no aluguel – fato que ocorre devido a Leitão, o responsável pelos pagamentos, ter gastado toda a grana com Cora, uma prostituta, que posteriormente vem a ser sua namorada. 

O grupo de amigos briga fortemente entre si e se vê em uma situação muito difícil, tendo a missão de ter que arrumar uma grande quantia de dinheiro em um curtíssimo período de tempo; caso contrário, seriam despejados. 

Hugo então tem a ideia de eles arrecadarem fundos servindo jantares chiques para grãfinos no apartamento deles, divulgando os eventos no site “JantarSecreto.com”. No entanto, em uma brincadeira de Leitão, ele acaba divulgando que o cardápio dos jantares, ao invés de carnes tradicionais, seria, na verdade, servido com carne humana. Além disso, o preço do jantar seria de 3 mil reais por pessoa. Mesmo excluindo o anúncio instantes depois da publicação, para a surpresa do grupo, o número de interessados e pagantes foi bastante alto. É nesse momento em que é estabelecido o primeiro dilema moral do livro: realizar um jantar secreto com carne humana como prato principal, assim conseguindo uma quantia de dinheiro até maior que a do valor da dívida do aluguel ou agirem corretamente e, portanto, arriscarem serem despejados?

Após discussões, o grupo toma a difícil decisão de enfim realizar o jantar. A questão é: como eles conseguiriam carne humana? Como eles iriam fazer os cortes? Diante de tantas questões (e várias outras que vão surgindo ao longo das páginas do livro), Raphael Montes constrói uma narrativa bastante instigante e envolvente, cheia de reviravoltas e personagens para lá de bem construídos. “Jantar Secreto” desperta as mais variadas emoções nos leitores, como nojo, susto, raiva e medo, por exemplo; por isso é necessário termos “estômago” durante a leitura (péssima piada, eu sei). Apesar disso, o ponto principal, a meu ver, é vermos o quão ruim e cruel o ser humano consegue ser, a ponto de, na ânsia de obter mais lucro e poder, não medir esforços para realizar as atitudes mais violentas possíveis. 

Para além dos personagens, que jamais imaginavam tomar certas atitudes, nós, leitores, também teremos nossa própria índole e caráter questionados e postos em xeque. “Será que, no lugar desses personagens, não tomaríamos essa mesma decisão, por mais inacreditável e errada que ela fosse?” “Se está tudo bem comer carne de boi, por exemplo, por que também não comer carne de cachorro ou mesmo carne humana?” É doido e até macabro parar para pensar nisso, não é? 

É nesse jogo de crimes insanos, cenas horripilantes e dilemas morais que o autor Raphael Montes consegue criar um suspense policial para lá de intrigante. Quem aprecia o gênero ou quem está disposto a experimentar uma leitura diferente certamente gostará desta narrativa repleta de inúmeros plot twists de tirar o fôlego do início ao fim.

Esta resenha faz parte da série Autores da Torre, do Projeto de extensão Torre de Babel, da Biblioteca José de Alencar (Faculdade de Letras/UFRJ)

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