Evento da indústria editorial, a 18ª Bienal do Rio, que ocupa de amanhã ao dia 11 de setembro uma área de 55 mil metros quadrados no Riocentro, não é exatamente uma feira literária – não no sentido estrito desta palavra. É uma feira do livro, o que faz tanta diferença que explica o aparente paradoxo do sucesso de massa do evento num país com três quartos da população em situação de analfabetismo funcional e que carrega o modesto índice de leitura de 4,7 livros anuais per capita, aí incluídas obras didáticas e técnicas.
Se a Flip é uma delicatessen, a Bienal é um hipermercado. Em Paraty, embalados em certa aura de alta cultura, poucos milhares de leitores vão ver e ouvir autores que só muito raramente dão as caras nas listas de best-sellers. No Riocentro, grandes vendedores de livros e até personalidades de outras praias atraem uma multidão prevista em 640 mil pessoas a uma festa que cresceu quinze vezes em público e 40 vezes em área em menos de trinta anos – não por acaso, o mesmo período em que explodiu no Brasil e no mundo a chamada cultura da celebridade.
Na Flip, o ator Marcello Antony seria um coadjuvante bem apessoado mas discreto, ofuscado, por exemplo, pelas ondas cerebrais do prolífico escritor português Gonçalo M. Tavares. No Riocentro ocorre o oposto: o público forma ululantes caudas de cometa em torno de celebridades como Antony, que estará no Riocentro para ler textos de Rubem Braga no espaço Livro em Cena, e a atriz e cantora americana Hilary Duff, que ano passado estreou como autora (ajudada por uma escritora profissional chamada Elise Allen) com o romance juvenil “Elixir”, que lançará neste domingo no recém-criado espaço Conexão Jovem.
Quanto a Tavares, que falará também neste domingo no Café Literário – uma ilha de literatura propriamente dita no oceano da Bienal, com curadoria do crítico e poeta Italo Moriconi – não será surpresa se, com sua barba, for confundido nos corredores do Riocentro com um ex-integrante do Los Hermanos.
Quem não tem vocação para engrossar cauda ululante de cometa deve ir à Bienal mesmo assim, por pelo menos três motivos:
1. Comprar livros – Parece óbvio, mas não é tanto. O empurra-empurra é um incômodo e os descontos dados pelas editoras em seus estandes não são nada impressionantes quando comparados aos que as grandes redes oferecem rotineiramente. No entanto, como a disputa por espaços em livrarias é cada vez mais cruenta e vem tirando das prateleiras obras lançadas há poucos meses, trata-se de uma oportunidade de garimpar bons títulos entre os livros de catálogo. Algo que se pode fazer a qualquer momento na internet, é verdade, mas sem o prazer do contato físico e a possibilidade de degustar o conteúdo.
2. Levar os filhos – A Bienal tem seu velho jeitão de parque temático acentuado este ano pelo espaço interativo hi-tech chamado Maré dos Livros. Ao lado de atrações habituais como contação de histórias, joguinhos e a própria atmosfera de frisson criada em torno do tema, isso garante a diversão das crianças e tem tudo para dar uma mãozinha na formação de apreciadores de livros. Pelo menos, mal não faz – o que não se pode dizer da insistência das escolas em enfiar pela goela dos miúdos um romance chatíssimo como “Senhora”, de José de Alencar, grande abortivo de leitores.
3. Acompanhar bate-papos intimistas com bons autores – Num bem-vindo efeito colateral do excesso de atrações simultâneas, é possível ver e ouvir em ambientes relativamente íntimos escritores como o já citado Gonçalo M. Tavares, Amitav Ghosh, Luis Fernando Verissimo, Zuenir Ventura, Cristovão Tezza, Pepetela e Ferreira Gullar, que em eventos como a Flip falariam para plateias de muitas centenas de pessoas. Para tanto, basta alguma organização para disputar as senhas, que começam a ser distribuídas uma hora antes de cada evento. A programação completa da Bienal pode ser conferida aqui.
Fonte: Veja