“A Paciente Silenciosa”, Alex Michaelides

Por Camille Loponte

🚨 ATENÇÃO: ESTA RESENHA CONTÉM SPOILERS 🚨

Com um jogo temporal imperceptível, “A Paciente Silenciosa” cumpre seu papel como um thriller psicológico inesquecível. A trama gira em torno do assassinato de Gabriel, morto por sua esposa, Alicia Berenson.

“Alicia Berenson tinha uma vida perfeita. Ela era uma pintora famosa, casada com um fotógrafo bem-sucedido e morava numa área nobre de Londres que dá para o parque de Hampstead Heath. Certa noite, Gabriel, seu marido, voltou tarde para casa depois de um ensaio para uma revista de moda e, de repente, a vida de Alicia mudou completamente. Alicia tinha 33 anos quando deu cinco tiros no rosto do marido. Depois disso, nunca mais disse uma palavra. A recusa da artista a falar ou a dar qualquer explicação transforma essa tragédia doméstica em algo muito maior, um mistério que atrai a atenção do público e aumenta ainda mais a fama da pintora. Entretanto, ao mesmo tempo que seus quadros passam a ser mais valorizados que nunca, ela é levada para o Grove, um hospital psiquiátrico judiciário na zona norte de Londres. Theo Faber é um psicoterapeuta forense que espera há muito tempo por uma oportunidade de trabalhar com Alicia. Ele tem certeza de que é a pessoa certa para lidar com o caso. No entanto, sua determinação para fazê-la falar e desvendar o mistério de por que ela atirou no marido o arrasta para um caminho tortuoso que sugere que as raízes do silêncio de Alicia são muito mais profundas do que ele jamais poderia imaginar. E se ela falar, ele será capaz de encarar a verdade?”

A sinopse não lhe prepara para o que está por vir. 

É impossível escrever sobre a obra de Alex Michaelides sem uma dose de spoilers, contidos a seguir.

 A leitura, quando isolada em seus momentos, parece desconexa; a história do psicoterapeuta Theo se mistura com a narração advinda do diário de Alicia, tornando confusa a forma como nos relacionamos com o livro. Inicialmente, apresentei grande resistência aos elementos de Theo durante a história. Não me interessava sua infância ou seu casamento fracassado, estava preocupada com Alicia; não sabia — ou não percebia — que a conexão entre os dois não havia sido iniciada no hospital psiquiátrico de Grove. Quanto à história, não há palavras que descrevam a experiência imersiva que a obra constrói. Alex conseguiu desenvolver um universo psicológico por completo; apenas no final do livro somos capazes de compreender a magnitude dos detalhes, desejando reler cada uma das entrelinhas que a história propõe. Arremessada a um plot twist digno de suspense, minhas hipóteses foram descartadas sem precedentes. Desafio qualquer um a desvendar o “mistério” e não se surpreender com a riqueza desta narrativa. Pode não parecer, mas cada página contribui para a próxima e para o todo.

Devo admitir que, apesar da genialidade psicológica alcançada pelo livro, para mim, a narrativa se fez cativante apenas na metade da leitura. As primeiras páginas e capítulos são, de certa forma, arrastados — devemos conhecer os personagens, suas origens e como se relacionam antes de partirmos para o que, de fato, buscamos. É, então, necessário compreender Theo para compreender Alicia e a conturbada verdade que os cerca. O leitor é, de certa forma, enganado por todo o enredo.

Assim como um bom suspense, os suspeitos são tão óbvios que é possível acreditar que Alicia nunca seria capaz de assassinar seu marido. O que estamos encarando? Um crime onde o verdadeiro culpado deve ser identificado? Ou os motivos profundos que tornam Alicia uma criminosa? Desejei acreditar que Alicia era inocente, e o fiz até as últimas páginas, onde finalmente somos apresentados à verdade. Quando descobrimos o motivo de seu silêncio, nos compadecemos de sua trajetória. Sinto a cabeça girar, relembrando a sensação inebriante de concluir essa leitura. É interessante ainda analisar quando Theo retorna à sua casa — o quanto parece seu pai, o quanto sua esposa, Kathy, se assemelha à sua mãe. Um fim trágico, inevitável.

Como crítica, gostaria que a escrita cessasse pouco antes, mas, ao invés disso, me proponho a interpretar a calmaria de Theo ao ser confrontado sobre a verdade. As consequências de ser como Alicia, o alívio de eximir-se da culpa e da mentira, o fim de uma vida existindo à base de mentiras. Sugiro não tomar minhas suposições como grandes verdades, o que desejo é interpretar a leitura como é para mim.

Declaro meu favoritismo aos autores como Alex, que retratam a mente com tanta precisão. Fui capaz de me projetar na narrativa e participar dela, sentindo dores, me identificando com os personagens e seus desconfortos — o que, para um thriller, é uma tarefa nada simples de suceder. Não diria, porém, que “A Paciente Silenciosa” entra para meus favoritos da literatura. A escrita arrastada tomou grande tempo e foi necessário me esforçar para avançar na leitura. Entretanto, não me contento em elogiar a construção temporal que confunde o leitor ao chegar nos últimos suspiros do livro. Uma trágica história da violência refletida na psique, “A Paciente Silenciosa” pode não atender a todas as expectativas, mas torna impossível não se chocar com a história.

Esta resenha faz parte da série Autores da Torre, do Projeto de extensão Torre de Babel, da Biblioteca José de Alencar (Faculdade de Letras/UFRJ) 

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