“Enclausurado”, Ian McEwan

Por Giovanna Durães

“Enclausurado” é uma obra surpreendente do renomado autor britânico Ian McEwan. Embora sua autoria seja estrangeira, este livro ecoa muitos dos desafios e temas contemporâneos enfrentados pelo Brasil e pelo mundo. Publicado em 2019, o romance é uma narrativa impactante e uma alegoria provocativa sobre a sociedade, o isolamento, a política e a justiça.  

A trama de “Enclausurado” gira em torno de um personagem atípico e peculiar: um feto. Sim, o protagonista, o qual é o narrador, está no útero de sua mãe, e a história é contada do ponto de vista desse feto. McEwan desafia o leitor com essa premissa incomum e cativante desde o início.  

Nesse espaço limitado, o feto se torna um observador aguçado e crítico do mundo que o cerca. Ele descreve com detalhes o som da música que a mãe ouve, as conversas que escuta e, até mesmo, as tensões e os medos que afligem a mãe durante sua gravidez. Através dos olhos e ouvidos do feto, somos convidados a refletir sobre a condição humana e as questões sociais que permeiam nossa existência.  

O cenário no qual a história se desenrola é uma nação fictícia, mas que lembra de maneira marcante o Brasil. O país está em meio a uma agitação política e social, e o enclausuramento do feto no útero de sua mãe é uma metáfora do isolamento, da polarização e do confinamento que podem ocorrer em sociedades em crise.

McEwan também aborda questões profundas de justiça e direitos humanos. Quando o feto testemunha um plano de sua mãe para cometer um crime, ele se vê diante de dilemas éticos complexos. Sua compreensão do mundo é moldada por suas observações e interpretações das conversas que ouve, e ele questiona a moralidade, a legalidade e a justiça.

A escrita de McEwan é elegante e perspicaz. Ele usa o ponto de vista do feto para explorar temas como a liberdade, a moralidade, a política e a ética de uma maneira inovadora. A narrativa é intensa e reflexiva, e o autor demonstra sua habilidade em criar um ambiente rico em detalhes e nuances.

Além disso, “Enclausurado” é uma obra que faz uma crítica social e política mordaz. Embora a história se desenrole em um cenário fictício, as questões que aborda são universalmente relevantes. A polarização política, a luta por direitos, a corrupção e o isolamento social são temas que ressoam com leitores de todo o mundo.

A metáfora do enclausuramento do feto também pode ser lida como uma reflexão sobre a alienação que muitas vezes afeta as pessoas em uma sociedade em crise. A sensação de estar aprisionado, sem controle sobre o próprio destino, é um tema recorrente ao longo do romance.

Através da perspectiva única do feto, McEwan nos desafia a questionar nossa própria compreensão do mundo e a refletir sobre as complexidades da condição humana. A obra é uma chamada à reflexão sobre as escolhas que fazemos, as responsabilidades que assumimos e as consequências de nossos atos.

Em resumo, “Enclausurado” de Ian McEwan é uma obra literária excepcional que transcende fronteiras geográficas e desafia o leitor a refletir sobre questões sociais, políticas e éticas universais. A narrativa inovadora, com um feto como narrador, é uma ousadia literária que funciona de maneira impressionante para criar uma experiência de leitura profunda e emocional. McEwan oferece uma visão perspicaz do mundo contemporâneo e suas complexidades, e seu livro é uma leitura obrigatória para aqueles que desejam explorar a literatura que vai além das fronteiras físicas e culturais, alcançando o cerne da experiência humana. 

Esta resenha faz parte da série Autores da Torre, do Projeto de extensão Torre de Babel, da Biblioteca José de Alencar (Faculdade de Letras/UFRJ) 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *